quinta-feira, 26 de dezembro de 2019



                       MARCOS FAYAD, UMA VIDA DEDICADA À ARTE


 Ator, diretor, produtor cultura e dramaturgo, Marcos Fayad morreu no dia 17 de abril, em Goiânia



  
“Combati o bom combate. Encerrei a luta, e guardei a fé” a frase do apóstolo Paulo identificava o e-mail do grande diretor de teatro, autor, ator, produtor cultural,  psicólogo/psicanalista e artista plástico Marcos Fayad, que morreu hoje de manhã, no Hospital Santa Helena.  Lutou como um bravo contra um câncer que aos poucos foi minando suas forças, mas não afetava a imaginação sempre em ebulição.  Enquanto se tratava em Goiânia e São Paulo, devorava  livros, de preferência autores  latinos, escrevia, criava personagens e espetáculos imaginários. Amava a psiquiatra Nise da Silveira com quem  estagiou  na Colônia Juliano Moreira, no Rio de Janeiro, ao concluir o curso de Psicologia, e o poeta norte-americano Walt Witman. Guimarães Rosa era outra de suas paixões.  
Marcos Fayad era intenso. Mergulhava de cabeça em tudo o que fazia. Optou pelo teatro ainda muito jovem. Trabalhou com grandes nomes do teatro brasileiro, integrou elencos de peças que marcaram época.  Natural de Catalão, foi para o Rio estudar Lá descobriu a verve teatral, que o traria de volta a Goiânia nos anos 1980, a convite do então secretário de Estado da Cultura Kleber Adorno. Inspirado no livro Martim Cererê, de Cassiano Ricardo, batizou o  Centro Cultural Martim Cererê, e  foi seu primeiro diretor.  
Não só na doença, combateu o “bom combate”  No teatro, travou duras batalhas. Fez sacrifícios e  driblou a falta de recursos e patrocínios para levar ao palco espetáculos inesquecíveis como Martim Cererê,  o belo poema que fala dos primórdios do Brasil e dos povos primitivos. A primeira versão da peça de 1988 percorreu diversas cidades e foi destaque na França. Uma segunda edição viria em 1998, em comemoração aos 10 anos da histórica montagem. Martim Cererê foi um marco em sua carreira e pavimentou o caminho para muitas outras.  
 Fayad escreveu, adaptou, e  produziu dezenas de peças e musicais. Puro Brasileiro é outro grande destaque. Ficou  20 anos em cartaz, com elencos diferentes, mas sempre um sucesso por onde passava. O musical, que resgata as raízes da música brasileira, fez turnê de Norte a Sul do País, emocionando milhares de espetadores. Seus mais recentes trabalhos foram Cara de Bronze, baseado na obra de João Guimarães Rosa e Cerimônia para Personagens, do russo Daniil Kharnus, de 2017, uma experimentação moderna e diferente de tudo aquilo no qual vinha apostando. Terminou aí seu trabalho na direção. 
 A instigante obra do dramaturgo francês Antonin Artaud levou ao palco como ator. Fayad a encenou com requinte em curta temporada na Capelinha São José, construída dentro do Clube do SESI Antônio Ferreira Pacheco, gentilmente cedida  pela diretor do Teatro SESI, Teco Faleiro. Apresentou-se também no Rio e em São Paulo. Com ela, despediu-se de Artaud, por quem tinha enorme admiração, assim como o filósofo Nietcheze, sua leitura de cabeceira.   
Marcos Fayad gostava de reunir amigos e atores para leituras dramáticas em jantares informais de comida árabe, esmeradamente preparada,  e vinho tinto em sua enorme casa rodeada de jardim.  Discos que trazia de suas viagens tocavam ao fundo. Apesar da origem árabe, era um apaixonado pela terra Goiá, a fazenda em Catalão, o interior sertanejo. Com rara sensibilidade, levou para o palco a beleza do cerrado e do homem sertanejo  em peças como Voar, baseada na obra do goiano Gil Perini, e Cerrado Celular, uma ousadia à época da encenação. Marcos apresentou a peça  debaixo de uma enorme tenda no estacionamento do Shopping Flamboyant. Recriou o ambiente de uma fazenda com cavalos, vacas e peões para falar sobre a chegada da modernidade do meio rural. Cabaré Goiano movimentou o Teatro Pyguá do Martim Cererê durante cinco anos, com muita música, cenas curtas debochadas e divertidas.  O sertão de Guimarães Rosa ganhou uma produção à altura em Cara de Bronze.  
Exigente, carismático, genioso, vaidoso. Mas, acima de tudo um  profissional de primeira linha. Formou uma geração inteira de atores que hoje ocupam os palcos.  Gostava de trabalhar ouvindo música, o canto dos pássaros, o latido dos  cachorros, seus companheiros inseparáveis, fazer bonzai, outra paixão. As paredes forradas de quadros, as estantes repletas de livros. Seu mundo era assim: com muita arte em torno de si. “Arte de qualidade!”, diria com muita ênfase, pronunciando  bem as palavras. Viveu de arte, e só de arte. “Não tenho  emprego público nem privado. Vivo de arte. Quero fazer o melhor”, dizia. 
Marcos Fayad deixou uma obra memorável, e seu nome escrito na história do teatro brasileiro. 
  Texto publicado no jornal O Popular                                 

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