segunda-feira, 11 de abril de 2011

AS MÃOS DE EURÍDICE


ATOR MARLEY DE FREITAS EM "AS MÃOS DE EURÍDICE


Quando estreou no início dos anos 1950, o monólogo As Mãos de Eurídice, de Pedro Bloch, não entusiasmou muito os críticos. Mas, o sucesso da história de Gumercindo Tavares, um bem sucedido empresário que foge com a amante Eurídice para Buenos Aires em busca dos prazeres da vida, foi surpreendente. Interpretada por Rodolfo Mayer, durante 25 anos, o personagem confundiu-se com o próprio ator que morreu em 1985.


Outros atores brilhantes como Mayer também viveram o papel com a mesma intensidade no Brasil e no exterior. João Bennio e Marley de Freitas também se identificaram de tal forma com o personagem que a cada nova apresentação a emoção transborda. Afastado do palco há cerca de 10 anos, Marley de Freitas retomou o papel , graças ao patrocínio da Lei Municipal de Incentivo à Cultura, sob a direção de Delgado Filho, do grupo Arte & Fogo, no Teatro Cici Pinheiro, da Casa das Artes.



A curta temporada conquistou uma razoável e interessada plateia de jovens, e acredito que não só pela história em si (que ainda nos parece bastante atual) mas também pela competência do ator que tão bem veste o personagem. Com 75 anos de idade, Marley de Freitas demonstra muito fôlego para absorver toda a carga dramática de Gumercindo Tavares, um homem infeliz no casamento, que se perde de amores pela bela e ambiciosa Eurídice. Ele aposta tudo que tem na esperança de encontrar a felicidade ao lado dela, e ambos fogem para Buenos Aires, onde as noites nos cassinos viram rotina.



Escrita em 1949, a história de Gumercindo parece bem atual. O próprio personagem sua história, fazendo do espectador o seu confidente. Como se buscasse respaldo pelos seus erros, ele vai justificando suas atitudes: o abandono da mulher e dos filhos por sete anos, a falência total nas mesas de jogo, e o desatino de matar a amante em momento de total desespero. Eurídice era hábil nas mesas de jogo, nas fichas e roletas dos cassinos. Quando Gumercindo pede uma de suas jóias para empenhar ou vender para pagar dívidas ela se recusa dizendo: “Elas são as únicas recordações de um amor que já findou”. Gumercindo cai no fundo do poço. Mata a amante, e foge para o Brasil.


Decadente volta para casa, o porto seguro do lar, mas percebe que tudo está mudado. A casa está vazia. Ninguém o espera mais. Procura a chave no bolso do velho paletó e ao entrar vasculha os móveis em busca de pistas da família. Nas gavetas vai desenrolando o fio da meada dos sete anos que passou fora com Eurídice.



Natural de Uberlândia, Marley de Freitas estreou como ator profissional aos 19 anos com a peça O Padre Jeremias. Com As Mãos de Eurídice fez turnês por diversas cidades. Segundo seus cálculos, de 1960 a 2011, fez cerca de 170 apresentações do monólogo. Com esta remontagem, o ator presta homenagem aos 60 anos da primeira encenação da peça e comemora seus 55 anos de carreira artística, demonstrando que está em boa forma, afinal o bom ator é a peça fundamental para o sucesso de uma peça. Delgado Filho foi comedido na direção, que exige muito do ator, conduzindo as cenas sem exagerar nas doses de dramaticidade.


Bloch


Médico, especialista em problemas de fala e audição, Pedro Bloch gostava de escrever e compor. Nascido na Ucrânia, veio para o Brasil ainda criança. É autor de mais de 30 peças. Entre mais conhecidas estão As Mãos de Eurídice e Os Inimigos Não Mandam Flores, dois trabalhos que foram encenados no Teatro da Malmo (Suécia), e dirigidos por Ingmar Bergman. Gostei muito de ter revisto o texto de Pedro Bloch encenado por Marley de Freitas.



As Mãos de Eurídice traz-me à memória a lembrança de João Bennio interpretando a peça no auditório do Instituto de Educação de Goiás (IEG), onde estudei quase a minha vida inteira. Achei lindo. Depois li o texto de Pedro Bloch. A partir daí o teatro passou a fazer parte da minha vida. Eu sou a prova de que um texto bem produzido, interpretado por bons atores conquistam plateias para sempre.


Foto: Gilson Borges

2 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. Valbene,

    Obrigado pela crítica e pelo seu profundo conhecimento da peça, valorizando com sua presença mais um espetáculo das Mãos de Eurídice.

    Marley de Freitas

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