terça-feira, 10 de maio de 2016



DRAMATURGIA 

  
“A dramaturgia é a forma mais estruturante, é o elemento básico da cena teatral”
                                                                               (Kil Abreu)

 
Kil Abreu  na primeira oficina do Núcleo de Dramaturgia


Pesquisador do teatro brasileiro, curador do Centro Cultural São Paulo e crítico teatral, Kil Abreu ministrou a primeira oficina do Núcleo de Dramaturgia, promovido pelo SESI, com o apoio da Lei Goyazes de Incentivo à Cultura.  No encontro com 16 participantes de Goiânia, selecionados previamente  por uma comissão de alto nível,  Kil Abreu traçou um Panorama da Dramaturgia Brasileira, assunto extenso que mereceu ampla discussão.
Para ele, a dramaturgia é essencial, o elemento básico da cena teatral.  Na sua avaliação, o teatro brasileiro vive hoje um processo liberalizante, bem diverso do que viveu nos anos 1980. Autores, diretores, atores e coletivos ousam, experimentam, abordam mais temas atuais com enfoque na realidade brasileira.  “Talvez hoje, a gente esteja vivendo muito mais do que em outras décadas, a criação de formas próprias, seja na experiência do grupo, dos coletivos de teatro, às vezes mais ou menos desenvolvidas dependendo do Estado em que se vá, seja nas figuras de autores de gabinete. Você descobre este Brasil sob um olhar novo, ou um olhar que revela a realidade como ela é hoje, num sentido de visitar a realidade de maneira própria”, sublinha. 
Kil considera importante o fomento a novos autores e enaltece a iniciativa  que oferece a oportunidade aos que querem ampliar seus conhecimentos na área. O fato de conhecer pouco a cena de Goiânia animou Kil a vir ministrar a oficina. “Como pesquisador, tenho muito interesse em conhecer todas as vertentes do teatro brasileiro. É muito bom compartilhar conhecimentos, encontrar pessoas, saber o que está sendo feito”, afirma.  

Leia abaixo alguns trechos abordados pelo pesquisador.

"Todos têm uma paixão viva pelo teatro"



Fora do eixo
“É uma experiência que primeiro inclui autores com perspectivas do teatro, da vida, do mundo muito diversas. Isso nos coloca diante também de uma produção para o teatro que é muito diverso, que tem muitas frentes diferentes, desde o teatro mais calcado, mais enraizado na tradição do drama, usual, do teatro mais tradicional, das formas dramáticas mais tradicionais até as formas teatrais experimentais mais radicais. Tudo isso faz parte da dramaturgia brasileira contemporânea. Os autores  não estão mais tão concentrados no eixo Rio-São Paulo,  mas sim em todo o Brasil. De norte a sul”.

Relevância
“O que me parece de mais relevante nesse contexto tão diverso (da dramaturgia)  é o fato de que a novidade histórica vive hoje uma liberalidade, vamos dizer assim. Ela é incomum se comparada, pelo menos ao teatro até nos anos 80, talvez. O que isso quer dizer? Que até esse período a gente vivia razoavelmente tentando cumprir a tarefa de atualizar no Brasil formas dramatúrgicas importadas, digamos assim, correr atrás de certas estruturas dramatúrgicas, narrativas. Às vezes de maneira competente, importante, interessante. Mas que eram tributárias de uma outra cultura. De um certo momento pra cá, especialmente hoje, dentro disso que eu estou falando ( de certa liberalidade da criação) a gente esteja praticando um teatro “errado” do ponto de vista de uma certa tradição da dramaturgia. Mas “certo” do ponto de vista da nossa necessidade própria de expressão, das nossas gerações, da nossa sociabilidade, das formas como nós brasileiros apreendemos,  aprendemos a nos amar, a nos odiar, a nos explorarmos a sermos parceiros”.

Novo olhar
“Não é que não tenha havido antes um teatro brasileiro. É que o teatro brasileiro até a umas duas décadas atrás cumpria um pouco a pauta de formas dramáticas que vinham sendo ditadas de fora para dentro. Talvez hoje, a gente esteja vivendo, muito mais do que em outras décadas, a criação de formas próprias, seja na experiência do grupo, dos coletivos de teatro, às vezes mais ou menos desenvolvidas dependendo do Estado em que se vá. Seja nas figuras de autores de gabinete, você descobre  este Brasil sob um olhar novo, ou um olhar que revela a realidade como ela é hoje, num sentido de visitar a realidade de maneira própria. Desde autores como Luis Alberto de Abreu, por exemplo, que é um autor mineiro que  vive em São Paulo e que acabou de escrever uma peça linda chamada “ Cabras, Cabeças que Voam, Cabeças que Rolam”. É  uma espécie de texto pré-dramático, narrativo, que diz muito sobre nós, sobre o Brasil. São quadros sobre o cangaço, uma referência relativamente antiga mas que nos surpreende com muita atualidade. Até autores do Nordeste, como Emanuel Nogueira que faz uma experiência com o que ele chama de tragédia em solo sertanejo, uma forma da tragédia traduzida no universo do sertão. Uma coisa bastante especial. São textos  muito bonitos. Até uma jovem autora, Grace Passô,  mineira muito importante, que tem uma dramaturgia  lírica, poética e que nem por isso deixa de dizer sobre as nossas formas de relação. Até as dramaturgias criadas dentro dos grupos de teatro.  São Paulo, por exemplo,  é uma cidade com muitos grupos de periferia, como a Brava Companhia,   e outros que se organizam para criar dramaturgias próprias.  O que a gente chama de Dramaturgia Brasileira Contemporânea é nutrida por todas essas frentes, seja de autores especiais, seja de grupos de teatro, e até de autores que escrevem por encomenda e acabam gerando obras belíssimas”.

Fomento
“É muito importante. Diria que é essencial para a vida do teatro. Aqui (em Goiânia), como em qualquer lugar do Brasil, a dramaturgia é o elemento mais estruturante, no sentido de que é o elemento básico, do qual o espetáculo cênico nasce. Fomentar o trabalho dos dramaturgos, formar novos dramaturgos, é sempre um projeto da maior importância. No caso especial de Goiânia, a preocupação  com a qualidade é muito grande. As pessoas que estão selecionadas para vir falar (no Núcleo de Dramaturgia do SESI)  são todos muito importantes na cena teatral, incríveis.  Alguns, inclusive, têm grande experiência não só na escrita como na pedagogia do texto teatral.  Roberto Alvim, Samir Yasbek e Grace Passô são autores centrais hoje na cena, que também têm projetos formativos, fazem parcerias, dialogam, trocam experiências com outros dramaturgos”.  

Diversidade
 “É um grupo (selecionados para o Núcleo de Dramaturgia SESI)  muito diverso, o que é ótimo para um processo de formação. A diversidade alimenta. É melhor ter um grupo diverso e com experiência, com repertório, com expectativas de teatro. Na interação,  eles podem se ajudar mutuamente, se iluminar. Às vezes dentro de algum conflito, podem criar possibilidades de crescimento artístico uns em relação aos outros. Isso é um dado interessantíssimo. A segunda coisa  importante, que eu percebi, é que todos (participantes) têm uma paixão viva pelo teatro, ainda que nem todos tenham o mesmo repertório. Tem gente que gosta de teatro mais como espectador do que como autor, ainda que a maioria esteja já escrevendo, mas que tem interesse vivo na direção.  Essas  diferenças acabam colaborando para um projeto que acho  muito interessante, do ponto de vista da colaboração entre eles”. 

Foto: Josemar Callefi


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