CARA-DE-BRONZE
CIA. MARTIM
CERERÊ RECRIA NO PALCO A BONITEZA DO SERTÃO
Estreia Cara-de-bronze |
Mesmo tendo vivido
boa parte de sua vida no Rio de Janeiro, para onde o pai o levou para estudar,
o diretor teatral, dramaturgo e ator Marcos Fayad nunca deixou de amar suas
origens. De volta a Goiás no final dos anos 1980, enveredou pelos temas
regionais, levando para o palco a beleza dos nossos ancestrais em Martim
Cererê, o cerrado goiano em Cerrado Celular, a autêntica música caipira em Puro
Brasileiro, a solidão do homem sertanejo em Voar e muitas outras peças que
retratam a terra Goiá, o homem, seus hábitos e costumes.
No seu último
papel como ator, viveu o atormentado Antonin Artaud em A Realidade É Doida
Varrida, que estreou em uma capelinha dentro do Clube Antônio Ferreira Pacheco,
ao lado do Teatro SESI. A pequenina capela transformou-se no manicômio onde
Artaud viveu a maior parte de sua vida. Fayad mergulhou de cabeça na insanidade
do personagem e com ele viajou para São Paulo e Rio de Janeiro. Muito bem no
papel, o espetáculo solo foi um sucesso. Assim como o solitário caipira do solo
Voar, criado pelo escritor Gil Perini.
Depois de
Artaud, Fayad fez parênteses de três anos para tratar um câncer. Passou por um
delicado transplante de medula, e um tratamento delicado. Mas, não perdeu a
esperança. Continuou a ler, pesquisar, escrever. Refeito do susto, tratou de
remontar um dos seus espetáculos mais marcantes: Cara-de-bronze. Batalhou
recursos do Fundo Estadual de Cultura, e pôs mãos à obra. Queria retomar a adaptação
da obra de Guimarães Rosa, um conto extraído do livro Corpo de Baile, publicado
há 60 anos. A história se passa em um único dia dentro de um curral de ajunta
de bois. Dez vaqueiros conversam sobre o dono da fazenda, o tal Cara-de-bronze,
homem poderoso e sábio como Deus, escuro e feio como o diabo. Cara-de-bronze
vive sua solidão dentro de um quarto da enorme casa de sua fazenda. É um enigma
para seus empregados.
Encontrar
atores dispostos a enveredar pelo sertão do autor de Grande Sertão: Veredas,
não foi tarefa fácil. Muitos fizeram o teste. Poucos, os escolhidos. Seis meses
de preparação, entre ensaios, criação de cenário, figurinos e iluminação, foi o
tempo que levou até a estreia.
Fayad inspirou-se
nas fazendas de criação de gado, nos vaqueiros e no universo sertanejo, para
compor o espetáculo. A trilha sonora, do violeiro Roberto Corrêa, já estava pronta
desde 1999, quando levou Cara-de-bronze ao palco pela primeira vez. Cercou-se
de profissionais experientes para recriar a fazenda do misterioso
Cara-de-bronze, presença constante no texto, mas que nunca aparece. Com sua viola,
Denis Malaquias pontua todo o espetáculo com sua cantoria. A iluminação
competente de Rodrigo Assis dá ao ambiente as nuances do dia e do anoitecer. O
galo canta e os passarinhos piam nas árvores do quintal, os bois berram no
curral. A cozinheira Colomira (Narla Araújo) serve comida e cafezinho.
O difícil texto
de Guimarães Rosa ganha vida no palco. Transporta o espectador para dentro do
palco, à realidade dos vaqueiros, que falam do patrão nunca visto. Dois
veteranos do palco, Danilo Alencar, o velho Tadeu e Newton Murce, o peão Grivo,
interpretam seus papéis com muita veracidade. Rigoroso nos detalhes, o diretor
não deixou de fora a catira, o berrante, a cantoria entoada Guerhard Sullivan,
Edmar Pereira, André Larô, Saulo Dallago, Tiago Barreto, Tarik Hermano e
Tarcísio Pires .
Exigente,
rigoroso, às vezes irracível, Marcos Fayad exige o máximo de dedicação de cada
ator. Emociona em diversos momentos. Cara-de-bronze
é uma bela recriação da história do
autêntico sertanejo, que ama sua terra e nela quer ficar para sempre.
Nos dias 1, 2 e
3 de julho, Cara-de-bronze estará em cartaz no Teatro Goiânia, depois de sua aguardada
estreia no Teatro SESI, em junho.
Fotos: Corália Elias